O Papel da filosofia africana face aos desafios do neoliberalismo
Artigo de Opinião

A Tertúlia Filosófica de Moçambique (TFM), é um projeto filosófico coordenado pelo filósofo Ernesto Hoguane (autor da obra Em Busca da Felicidade Perdida: da Felicidade Individual à Felicidade Colectiva), que consiste num espaço virtual e/ou presencial de debate de temáticas de política, ética, economia e sociedade.
Pretende-se com este projeto discutir temáticas da atualidade através de diversos oradores, entre estudantes e professores de Filosofia e depois se publicar os discursos proferidos num jornal electrónico como artigos de opinião e/ou em revistas científicas (dependendo da pertinência dos temas).
Pelo que, todas às últimas quintas-feiras de cada mês teremos um tema de destaque e no máximo quatro (4) oradores que discutiram com os participantes.
Uma nota relevante sobre o dia de África.
Por: Tertúlia Filosófica de Moçambique (TFM)
Sabemos que desde a sua formação em São Francisco, no ano de 1945, a ONU desempenhou frente à África três papéis principais nomeadamente:
(i) O primeiro é referente a uma potência imperial coletiva herdado da Sociedade das Nações;
(ii) O segundo é de ser um aliado do movimento de libertação dos países africanos, e por fim,
(iii) O terceiro é relativo ao facto de ser um parceiro no âmbito do desenvolvimento dos países africanos. Ora, a partir de 1963 a situação melhorou para a África.
A criação da Organização para a Unidade Africana (OUA), inaugurando uma nova era no curso da evolução das relações entre a África e as Nações Unidas. Com a criação da OUA, em Maio de 1963, a África podia desde então apoiar-se sobre uma estrutura de acolhimento, de diálogo, de negociação e de acordos com o mundo exterior, e até com os colonizadores (Cf. KOUASSI, 2010: 1054)1. Todavia, existe hoje um fenómeno que põe em causa, em crise a Unidade Africana. Estamos falando do neoliberalismo – definido por Cureva (2013: 28)2 como sendo um termo usado para descrever uma corrente de pensamento político que defende a instituição de um sistema de governo onde o indivíduo tem mais importância do que o Estado, sob a argumentação de que quanto menor for a participação do Estado na economia, maior é o poder dos indivíduos e mais rapidamente a sociedade pode-se desenvolver e progredir para o bem dos cidadãos.Assim sendo, a missão da filosofia Africana hoje deve emergir daquilo que entendemos ser a própria filosofia enquanto filósofos africanos.

Para Castiano, a filosofia é vista como sendo um pensar fundamentador, ou seja, de fundamentação. Filosofia tem, a pretensão de procurar fundamentar as condições e possibilidades de existência e/ou de interpretação das causas mais gerais dos fenómenos da natureza, da sociedade e do pensamento (CASTIANO, 2013: 05)3. Pela definição dada pelo autor, podemos concluir que a missão ou/e o papel da filosofia africana é de fundamentar, argumentar sobre as condições e possibilidades da existência dos africanos. Significa, fazer uma reflexão crítica e esboçar argumentos e pensamento “escudo” sobre os fenómenos que se apresentam como risco, como perigo para as comunidades e Estados africanos. A título do exemplo, o neoliberalismo que se apresenta como monstro hoje.
Portanto, valores como a vigilância, a unidade enquanto nações e Estados africanos, a resistência, solidariedade entre africanos, principalmente com as camadas mais fracas e pobres dos Estados, o consenso, a fraternidade e o espírito de comunidade, devem ser a forma de ser e de estar de todos os africanos, principalmente, os representantes dos Estados. Só assim, na minha opinião, poderemos conseguir dar uma resposta e reacção a altura ao fenómeno que assola a África hoje (o neoliberalismo). Ora, a vigilância é e deve ser mais contra tudo aquilo que poderia ser destruidor e colocaria em risco o contínuo de uma relação formidável entre o Eu-Africano e o Outro-Africano, como a permanência de uma africanidade promissora e próspera. Desta feita, isso significa que devemos libertamo-nos de sentimentos rancorosos causados pelas acções do passado (se existirem), o que faria com que o Outro-Africano fosse visto como ameaça. Isso significa também estarmos atentos para que os erros que foram cometidos no passado africano, não voltem com mais força para atormentarmo-nos a nós e aos nossos filhos. Como ainda significa também, que coloquemos sempre as nossas prioridades viradas para o bem do continente africano acima das nossas veleidades egoístas e/ou individualistas, para tornarmo-nos verdadeiros promotores e desenvolvedores da Mãe-África. Contudo, a filosofia e o filósofo deve ser, a moda aristotélica, mais do que nunca, estudar o conhecimento das coisas pelas suas causas primeiras e últimas, obtidas pela luz natural da razão. Isto quer significar que a argumentação lógica-racional, baseando-se em princípios da razão, os filósofos são hoje chamados para fazer leituras deste evento-mundo (neoliberalismo) que assola a humanidade africana, e fazer suas contribuições teóricas através das quais se pode resistir enquanto continente assolado. Há de facto, a necessidade de pensar-se de forma utópica sobre as condições e possibilidade de criar-se uma nova sociedade africana, não mais narcisista, competitiva e individualista, consumista, mas que tenha como substrato o humanismo ubuntuísta; o reconhecimento do Outro-Africano ou/e das diferenças, a diminuição da desigualdades sociais e o novo sentido da sociedade humana. Precisamos de facto, de uma sociedade africana mais humana na qual triunfe, não mais os desejos individuais e egocêntricos, mas o altruísmo, a empatia, a simpatia e o amor.
Tertúlia Filosófica de Moçambique
Tertúlia Filosófica de Moçambique
Como também se deve dar maiores investimentos na educação para garantir a aprendizagem adequada e qualificada das nossas crianças para um futuro africano mais próspero.

Diálogo Intersubjectivo como Instrumento para Fazer Face aos Problemas Neoliberais. E convido-vos para que nos engajemos todos no pensar sobre a África e Moçambique em particular, só assim podemos juntos construir o futuro colectivo que queremos.O dialogo deve ser intersubjectivo como Instrumento para Fazer Face aos Problemas Neoliberais. Ora, uma análise mais atenta nos faz compreender que depois que a África alcançou a independência, o papel principal foi defender a legitimidade do pensamento crítico africano, ou seja, o debate cingia-se na defesa da existência de uma filosofia africana depois da acusação ocidental negando a existência de uma massa crítica em África.Entretanto, esse debate perde legitimidade nos tempos hodiernos. A questão é, hoje a filosofia africana muito longe de defender a sua legitimidade, é chamada a reflectir e a apresentar soluções pragmáticas dos problemas que apoquenta a África hoje. Ora, encontramo-nos num contexto de globalização, do neoliberalismo económico, capitalismo neoliberal, depende de como pretendemos designar.
O que nos preocupa nesse processo é que a África, como sempre foi, é o continente menos beneficiado. Ainda hoje a África e Moçambique em particular, continuam como fontes de uma exploração desenfreada dos recursos naturais. O que é mais desolador ainda, é que para além da África ser a menos beneficiada economicamente, apesar de ser a fonte dos recurso, a África e Moçambique em específico colhe do processo, Violência jamais vista, terrorismo, conflitos armados, pobreza cada vez mais acentuada, entre todos outros possíveis de imaginar.Nestas condições, parece que muito longe da riqueza natural africana representar uma bênção para os africanos, ela é uma maldição, fonte de todos males que a humanidade pode ter conhecido desde a sua génese. Contudo, como escreve Ngoenha na Intercultura, Alternativa à Governação Biopolítica? (2013), a solução para a globalização ou ultraliberalismo como ele prefere denominar, não é abdicarmo-nos da globalização ou do neoliberalismo, antes trata-se de encontrar globalizações alternativas.O que seria então encontrar globalizações alternativas? Seria antes e acima de tudo encontrar formas alternativas que permitam com que os benefícios da globalização, da governação neoliberal, do capitalismo económico sejam igualmente partilhados por todos, quer dizer, não deverá ser mais uma parte dos envolvidos a usufruir dos benefícios enquanto os outros colhem apenas as desgraças e os horrores do processo.Porém é preciso que tenhamos consciência de que esse processo não é automático, é preciso que nos empenhemos e lutemos para isso.
Ora, tal como no passado nos unimos na luta pela nossa soberania, e conseguimos, hoje, mais do que nunca somos chamados mais uma vez a nos mobilizarmos na luta e defesa do nosso futuro colectivo, pelo legado que pretendemos deixar para as futuras gerações.Com efeito, na nova luta, o instrumento da luta não são armas do fogo, sabemos que elas têm custos associados, mais devastadores ainda. Nestes termos, propomos o diálogo intersubjectivo como instrumento ideal para a defesa da nossa posição no xadrez da geopolítica neoliberal. Isso implica a necessidade de se organizar uma plataforma na qual iremos discutir os caminhos para o nosso futuro colectivo.
Desta vez, não será mais um ou dois grupos a decidirem sobre o que é melhor para todos (sem contar com as decepções que nos pregaram ao longo da história), será literalmente necessário que todos participem do debate, que todos tenham a possibilidade de discutir sobre o nosso futuro colectivo e sobre o destino para o qual o neoliberalismo parece nos empurrar.Com efeito, a filosofia africana tem um papel preponderante nesse processo, que é consciencializar a todos a se prepararem para a batalha. Mas também e sobretudo, a chamar a razão dos fazedores da política a resgatarem os velhos valores, como a visão de Estado, e a prioridade do bem colectivo em detrimento dos interesses individuais.
Palavras-Chave: África; Filosofia Africana; Neoliberalismo.Pela atenção dispensada, disse e muito obrigado!
(Tertúlia Filosófica de Moçambique)